Arqueologia da Fortaleza de São José de Macapá

Fortress of São José de Macapá

A Amazônia brasileira desperta interesse internacional desde os mais remotos períodos da colonização do Brasil. Portugueses, franceses, ingleses e holandeses tentaram se estabelecer nesta área a partir do inicio do século XVI. Muitas fortificações foram erguidas na região amazônica por diferentes nações. Uma maioria significativa destas fortificações foram erguidas em madeira e terra, conseqüentemente perecíveis. Outras foram construídas em pedra, obedecendo a um critério mais rígido preconizado pela engenharia militar, como é o caso da Fortaleza de São José de Macapá.

Os conflitos internacionais decorrentes da tentativa de soberania da Amazônia exigiram de Portugal uma medida enérgica para garantir a posse definitiva desta cobiçada região.

O Marquês de Pombal encarregou-se de prover o sistema defensivo da amazônia brasileira. Uma significativa quantidade de fortificações foram erguidas nesta área objetivando a sua posse e conseqüentemente a sua exploração.

Na segunda metade do século dezoito, Portugal e Espanha se empenhavam no estabelecimento em definitivo dos limites entre suas colônias. A demarcação dos limites, apesar das comissões de ambas as metrópoles, designadas para este trabalho, arrastavam-se sem se chegar a uma definição.

O Tratado de Madri (1750), que admitia como espanholas as terras da bacia do rio da Prata e como portuguesas as terras da bacia do rio Amazonas, foi anulado em 1761, trazendo oficialmente de volta a questão, ainda sob o reinado de dom José I.

A este tempo, ainda a questão do povoamento da bacia Amazônica, que lhes garantisse a posse, representava um fator preponderante. A baixa densidade demográfica de colonos, não atendia às necessidades da coroa portuguesa para invocar o uti possidetis na disputa com a Espanha pelas terras, durante o estabelecimento dos limites. O quadro ainda mais se agravava com a presença das numerosas missões religiosas que congregavam milhares de indígenas, cujo domínio temporal estava afeto aos religiosos.

Do ponto de vista do Estado, dois focos principais de missões preocupavam as autoridades: ao sul, os Sete Povos do Uruguai, e ao norte, o conjunto de missões da Amazônia. As soluções políticas adotadas para estas áreas diferiram, ainda que estivessem balizadas pelo interesse de garantir o domínio da colônia. Diferentemente das ações levadas na região sul, na Amazônia, a estratégia utilizada, destruiu as missões e aldeamentos religiosos, apenas formalmente, como instituição; a população (pelo menos em termos), foi preservada. As aldeias das missões foram então, por determinação, transformadas em vilas ou povoados. Transformação que teria como objetivo cercear a autonomia daquelas aldeias, livrando-as da tutela da autoridade missionária e gerando uma nova condição administrativa e social, assegurando assim a soberania portuguesa. Este processo de integração consistiu ainda na imposição da língua portuguesa, embora a grande maioria dessas populações fosse constituída por indígenas.

As aldeias de maior porte foram elevadas à categoria de Vilas, enquanto que as menores, a lugares. Esta foi fundamentalmente a estratégia de ocupação do território, adotada por Mendonça Furtado seguindo a orientação da política pombalina, no sentido de integrar definitivamente a região ao Império Português.

Havia interesse, por parte do Governador, no cumprimento imediato das mudanças determinadas pela Metrópole, o que o teria levado a buscar verificar pessoalmente a implantação das determinações. As viagens que realizou pelo território sobre sua responsabilidade permitiram uma avaliação das condições e dos processos de ocupação que se haviam desenvolvido na região, como ainda da política que deveria ser adotada no sentido de melhor garantir a soberania portuguesa. Até então, o que havia, do ponto de vista da colonização portuguesa ao longo do Amazonas e seus tributários, consistia em algumas praças militares de pouca eficiência; precárias feitorias provisórias, abertas e mantidas nas horas necessárias para a movimentação de atividades econômicas - "coleta florestal e de pesca e salga da mercadoria extraída das águas"; e aldeamentos sob a responsabilidade de ordens religiosas, comunidades isoladas, não vinculadas a um processo de colonização aos moldes que interessavam ao governo português.

Desde a primeira metade do século dezessete os portugueses já haviam assentado bases no litoral, nas proximidades da entrada do Amazonas. De fato ocuparam, sobretudo, alguns pontos na margem direita. Longe estavam de poder garantir o acesso ao rio. O grande delta do Amazonas não poderia ser facilmente defendido, sobretudo considerando-se o alcance das armas da época. Os fortes do Presépio e Gurupá correspondiam às duas maiores forças dispostas na entrada do rio. O primeiro, um importante forte, na margem direita, junto ao qual se iniciava a vila de Belém. O segundo, o forte de Gurupá, era um complemento importante, para o primeiro; um excelente posto de observação na área correspondente à margem esquerda. Aos portugueses, ao contrário dos espanhóis, interessava guarnecer, ocupar, o rio no sentido da foz para montante. Procedimento inverso àquele sugerido aos espanhóis por Acuña. Desde 1646, quando foram expulsos os últimos holandeses, com a tomada do forte Maiacaré, junto ao cabo Norte, os estrangeiros não tinham voltado a se estabelecer no rio.

Mas a subida do Amazonas, só se deu efetivamente, a partir de 1637 com as informações trazidas pelos dois franciscanos que desceram desde o rio Napo até o Gurupá e posteriormente com os resultados advindos da cartografia elaborada pela expedição de Pedro Teixeira. A interiorização das povoações portuguesas no Norte serviria para caracterizar, para garantir, a ampliação das fronteiras da colônia.

Assim, a construção da Fortaleza de São José de Macapá já constava dos planos do Governador Mendonça Furtado, desde a criação da então povoação de Macapá (1751). Integrava os planos de ampliação das fronteiras da colônia, definidas inicialmente pelo tratado de Madri (1750) – posteriormente anulado -, e definitivamente pelo Tratado de Santo Idelfonso (1777), em que se reconhecia a ocupação portuguesa e legitimava a posse do território pretendido pelos portugueses.

Mas a Fortaleza de São José de Macapá não fora construída naquela ocasião. Apenas em 1764 foi iniciada, com a construção do baluarte São Pedro, sob a responsabilidade de um engenheiro integrante da Comissão Demarcadora de Limites, Henrique Antonio Gallucio.

Sua construção se estendeu por 18 anos, sendo inaugurada no ano de 1782, no dia do santo padroeiro da cidade de Macapá, e orago da fortaleza: São José.

De acordo com este espírito da política pombalina foi construído, às margens do rio Amazonas, nas coordenadas de a Fortaleza de São José de Macapá. Trata-se de uma fortaleza complexa, do ponto de vista da engenharia militar. Além de possuir uma grande dimensão, sobretudo se comparada com as demais fortificações brasileiras, apresenta um complexo externo de obras de defesa como fosso, redente, revelim, caminho coberto, etc..

A Fortaleza de São José de Macapá cumpriu o seu papel de guardiã do espaço a ela confiado tornando-se co-responsável, juntamente com outras congêneres, pela consolidação e manutenção da extensão territorial do Brasil, sobretudo na Região Amazônica.

A despeito dos 'ataques' decorrentes dos agentes naturais, a fortaleza resistiu. Resistiu ao ímpeto das águas do rio, às investidas do igarapé que alimentava seu fosso. Resistiu ainda ao 'cerco' da cidade e às ocupações em sua esplanada. Tombado pelo Governo Federal, a fortaleza é hoje protegido também pelas ações do Governo Estadual que propiciou a reintegração dos espaços da praça fortificada, desapropriando e demolindo as edificações levantadas em suas proximidades.